quarta-feira, 21 de maio de 2014

O analfabeto político


Para atualizar, um texto sempre atual.



O pior analfabeto é o analfabeto político.
Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos.
Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão,
do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio
dependem das decisões políticas.

O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia
a política. Não sabe o imbecil que da sua ignorância política nasce a prostituta,
o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos que é o político vigarista,
pilantra, o corrupto e lacaio dos exploradores do povo.
Nada é impossível de Mudar
Desconfiai do mais trivial, na aparência singelo.
E examinai, sobretudo, o que parece habitual.
Suplicamos expressamente: não aceiteis o que é de
hábito como coisa natural, pois em tempo de desordem
sangrenta, de confusão organizada, de arbitrariedade consciente,
de humanidade desumanizada, nada deve parecer natural
nada deve parecer impossível de mudar.



Bertold Brecht

terça-feira, 21 de maio de 2013

Oscar Wilde


Quem Poderá Calcular a Órbita da sua Própria Alma?  

As pessoas cujo desejo é unicamente a auto-realização, nunca sabem para onde se dirigem. Não podem saber. Numa das acepções da palavra, é obviamente necessário, como o oráculo grego afirmava, conhecermo-nos a nós próprios. É a primeira realização do conhecimento. Mas reconhecer que a alma de um homem é incognoscível é a maior proeza da sabedoria. O derradeiro mistério somos nós próprios. Depois de termos pesado o Sol e medido os passos da Lua e delineado minuciosamente os sete céus, estrela a estrela, restamos ainda nós próprios. Quem poderá calcular a órbita da sua própria alma?

 

Não Tenhas Medo do Passado  

Não tenhas medo do passado. Se as pessoas te disserem que ele é irrevogável, não acredites nelas. O passado, o presente e o futuro não são mais do que um momento na perspectiva de Deus, a perspectiva na qual deveríamos tentar viver. O tempo e o espaço, a sucessão e a extensão, são meras condições acidentais do pensamento. A imaginação pode transcendê-las, e mais, numa esfera livre de existências ideais. Também as coisas são na sua essência aquilo em que decidimos torná-las. Uma coisa é segundo o modo como olhamos para ela.  

 

  A Imoralidade da Moral 

 A discórdia é sermos obrigados a estar em harmonia com os outros. A nossa própria vida é o que há de mais importante. Agora, se quisermos ser pedantes ou puritanos, podemos tecer as nossas considerações morais sobre a vida dos outros, mas estas não nos dizem respeito. Para além disso, o individualismo é realmente o mais elevado dos ideais. A moralidade moderna consiste na aceitação dos modelos da nossa época. Julgo que aceitar o modelo da nossa época será, para qualquer homem culto, a mais crassa das imorallidades. 
 

  A Beleza da Tragédia  

É frequente desencadearem-se as verdadeiras tragédias da vida de uma maneira tão pouco artística que nos magoam com a sua crua violência, a sua tremenda incoerência, carecendo absolutamente de sentido, sem o mínimo estilo. Afectam-nos do mesmo modo que a vulgaridade. Causam-nos uma impressão de pura força bruta contra a qual nos revoltamos. Por vezes, porém, cruzamo-nos nas nossas vidas com uma tragédia repassada de elementos de beleza artística. Se esses elementos estéticos são autênticos, todo o episódio apela à nossa apreciação do efeito dramático. De repente deixamos de ser actores e passamos a espectadores da peça. Ou antes, somos ambas as coisas. Observamo-nos, e todo o encanto do espectáculo nos arrebata.

Insanidade

Perco a cordura tranquilamente para insandecer de vez. As máscaras são reflexos do que se pretende ser. O disfarce é para os que se consideram astutos, mas que intrinsecamente são fracos. Não, não há aqui um julgamento, afinal cada um tem o seu próprio tempo e somos humanos. Podemos não entender ou até mesmo rechaçar a simples vista. Mas não podemos olvidar que estamos baixo o mesmo céu e que há mais coisas que nos aproximam do que nos separam. A consternação de que a sintonia não existia.
Amplexos furtivos, onde o desejo é sentido de forma unilateral. Contrariar o que se aprende, caimos do pedestal da ingenuidade quando mantemos a crença de que sim, tudo pode ser possível. Podemos sonhar, angariar pretextos para reiterar que a fortaleza de um desejo pode ser indestrutível. Desconstruir ideias, conceitos, romper paradigmas... estraçalhar por dentro o último suspiro da esperança.
Dejetos que poderiam ser puros, mas que são definidos como asquerosos quando não há o toque do espírito. A essência complexa a cada ser, inerente a sua própria condição individual.
Louco desvairado, bêbado de tristeza e desilusão. O perigo de limitar-se a outro campo que curiosamente é construído com os mesmos átomos. Daí a inconstestável presença de algo supremo. Como um jogo virtual, comandado por um sádico, sim, sádico agora, porque tenho a cólera trafegando internamente nas minhas veias. É passageiro, pois logo me redimirei... a redenção dos feridos que presunçosamente acreditam que são bons e merecedores de consumar isso que todos almejam. Cargo um texto de metáforas porque não há pretensão de que nunca ninguém possa entender esses momentos de devaneios. Minha alma já se encarregará de encontrar o equilíbrio, mas enquanto isso não acontece... masturbo a mente e estrupo a minha coerência.
Há tesão na loucura, na ira... logo tudo isso chegará a uma catarse e voltarei ao ponto equilibrado. Mas enquanto isso não acontece, aproveito o tempo que isso sinto para vociferar o que dentro do meu egocentrismo considero pura injustiça. Incrível, há um puro egoísmo em tudo isso. Magnificado, potencializado... "se" ou "quase" não são suficientes para quem sente a ira dos deuses.
Bem resolvido estou, quando não tenho uma puta flecha cravada no peito. Abro mentalmente o coração e cuspo toda a berbena que ela me trouxe. Fugaz. Efêmero.
Oh lord... que a porra da fantasia pueril volte ao seu calcês e a calma não permita que essa simples bolsa material não exploda diante do espelho.Basta de sofismas.
Oxalá essa energia permanecesse um tempo mais e que a minha natureza não me traísse. Me impulsaria a fazer o que sempre fiz, por outros motivos. É tempo de mudança... é hora de reconsiderar o norte outra vez. Agora sou híbrido e caminho inexoravelmente para a complexidade da simplicidade do fim.


O exercício da crônica

Escrever é um exercício que eu realmente gosto. E muitas vezes quando estou dissertando sobre algum assunto determinado, vou digitando sem pensar muito no resultado e independente dele, sinto essa satisfação que somente as pessoas que o faz, conhece. Funciona como terapia, pois exorcizamos demônios ao exteriorizar nossas inquietações. Tento ser discreto quando falo dos meus sentimentos, tento não, talvez eu realmente seja assim. Por isso uso metáforas. A interpretação fica livre para quem lê. Quando isso ocorre, quando alguém entende o que exponho, existe essa sensação mágica de sintonia e automaticamente se reitera a crença de que estamos todos conectados, alguns mais e outros menos, pois cada um tem o seu próprio tempo. É bom saber que somos vários que coexistimos na mesma vibração. Somos felizes naturalmente e não dependemos de ninguém para sentir a felicidade. Mas como qualquer outro sentimento, quando vemos reflexos em outros pontos, a sensação se multiplica. Sentimento de identidade coletiva.
Mas também gosto de escrever de forma objetiva e pragmática. Deixar meu ponto de vista, com a consciência de que sempre posso estar equivocado nas minhas opiniões. A mudança de perspectivas nos traz experiências e diversas vezes podemos ver as coisas de outra maneira. Isso é uma das maravilhas de estar aqui. Mudar de ideia sem medo e teimosia. Tem gente que tem vergonha, é o super ego magnificado.
Mas enfim, o que pretendia com esse post era expressar algo que me acontece com certa frequência. Às vezes sinto sensações absurdas, variáveis, emoções extremas e logo vem a necessidade automática de expressar isso com palavras e simplesmente elas desaparecem. Então lembro da crônica de Vinicius de Moraes.

                                            O exercício da crônica

Escrever prosa é uma arte ingrata. Eu digo prosa fiada, como faz um cronista; não a prosa de um ficcionista, na qual este é levado meio a tapas pelas personagens e situações que, azar dele, criou porque quis. Com um prosador do cotidiano, a coisa fia mais fino. Senta-se ele diante de sua máquina, acende um cigarro, olha através da janela e busca fundo em sua imaginação um fato qualquer, de preferência colhido no noticiário matutino, ou da véspera, em que, com as suas artimanhas peculiares, possa injetar um sangue novo. Se nada houver, resta-lhe o recurso de olhar em torno e esperar que, através de um processo associativo, surja-lhe de repente a crônica, provinda dos fatos e feitos de sua vida emocionalmente despertados pela concentração. Ou então, em última instância, recorrer ao assunto da falta de assunto, já bastante gasto, mas do qual, no ato de escrever, pode surgir o inesperado.
Alguns fazem-no de maneira simples e direta, sem caprichar demais no estilo, mas enfeitando-o aqui e ali desses pequenos achados que são a sua marca registrada e constituem um tópico infalível nas conversas do alheio naquela noite. Outros, de modo lento e elaborado, que o leitor deixa para mais tarde como um convite ao sono: a estes se lê como quem mastiga com prazer grandes bolas de chicletes. Outros, ainda, e constituem a maioria, "tacam peito" na máquina e cumprem o dever cotidiano da crônica com uma espécie de desespero, numa atitude ou-vai-ou-racha. Há os eufóricos, cuja prosa procura sempre infundir vida e alegria em seus leitores e há os tristes, que escrevem com o fito exclusivo de desanimar o gentio não só quanto à vida, como quanto à condição humana e às razões de viver. Há também os modestos, que ocultam cuidadosamente a própria personalidade atrás do que dizem e, em contrapartida, os vaidosos, que castigam no pronome na primeira pessoa e colocam-se geralmente como a personagem principal de todas as situações. Como se diz que é preciso um pouco de tudo para fazer um mundo, todos estes "marginais da imprensa", por assim dizer, têm o seu papel a cumprir. Uns afagam vaidades, outros, as espicaçam; este é lido por puro deleite, aquele por puro vício. Mas uma coisa é certa: o público não dispensa a crônica, e o cronista afirma-se cada vez mais como o cafezinho quente seguido de um bom cigarro, que tanto prazer dão depois que se come.
Coloque-se porém o leitor, o ingrato leitor, no papel do cronista. Dias há em que, positivamente, a crônica "não baixa". O cronista levanta-se, senta-se, lava as mãos, levanta-se de novo, chega à janela, dá uma telefonada a um amigo, põe um disco na vitrola, relê crônicas passadas em busca de inspiração - e nada. Ele sabe que o tempo está correndo, que a sua página tem uma hora certa para fechar, que os linotipistas o estão esperando com impaciência, que o diretor do jornal está provavelmente coçando a cabeça e dizendo a seus auxiliares: "É... não há nada a fazer com Fulano..." Aí então é que, se ele é cronista mesmo, ele se pega pela gola e diz: "Vamos, escreve, ó mascarado! Escreve uma crônica sobre esta cadeira que está aí em tua frente! E que ela seja bem-feita e divirta os leitores!" E o negócio sai de qualquer maneira.
O ideal para um cronista é ter sempre uma os duas crônicas adiantadas. Mas eu conheço muito poucos que o façam. Alguns tentam, quando começam, no afã de dar uma boa impressão ao diretor e ao secretário do jornal. Mas se ele é um verdadeiro cronista, um cronista que se preza, ao fim de duas semanas estará gastando a metade do seu ordenado em mandar sua crônica de táxi - e a verdade é que, em sua inocente maldade, tem um certo prazer em imaginar o suspiro de alívio e a correria que ela causa, quando, tal uma filha desaparecida, chega de volta à casa paterna. 

 


quarta-feira, 8 de maio de 2013

segunda-feira, 6 de maio de 2013

Forasteiro no próprio país


O falecido neuropsiquiatra Décio Nakagawa cunhou a expressão "síndrome do regresso" para definir o "jet lag espiritual" que afeta os ex-imigrantes. Ainda estando na Espanha, li matérias relacionadas a este assunto, indicadas por uma amiga que se preocupava comigo, quando revelava a minha pretensão de retornar ao Brasil.
Apesar de conhecimento e considerar que eu tinha uma estrutura emocional para voltar ao lugar onde nasci sem maiores crises, na prática, percebi que mesmo tendo em conta todas as mazelas brasileiras e tê-las vivido a maior parte da minha vida, ainda assim acabei sendo atingido.
A reintegração ao mercado de trabalho não é tão fácil. Custa assimilar realidades diferentes. Na Espanha, onde não existia esse abismo entre classes sociais, trabalhando com uma remuneração mínima era suficiente para suprir necessidades básicas , além de ter acesso a cultura e lazer. Sempre recordo a frase de outra amiga que dizia que era preferível ser pobre na Europa do que no Brasil. E sempre soube que ela estava certa.
Mas independente das adversidades que aqui existem, aprendemos a controlar essa indignação com o tempo. Não quero perder isso, mas não posso sofrer por tudo que vejo. A falta de seriedade nas instituições e nas pessoas. Lembro constantemente das observações feitas na década de 30 do século passado por Sérgio Buarque de Holanda, no livro "Raízes do Brasil". Esse tremendo caos pela falta de organização e respeito ao próximo. Um país mestiço construído com pilares da parte negativa de cada cultura trazida para cá.
São observações genéricas sobre a situação brasileira. Mas olhando mais para dentro, o pior de tudo é o que acontece com a gente internamente.
Mesmo conservando os amigos de sempre, quando cheguei ao Brasil, senti que não me encaixava em lugar nenhum. E assim continua sendo. Quando parti, o trem continuou andando por aqui. Não há muito do que deixei há doze anos. Minha gente mais querida acabou de acostumando com a minha ausência e isso acaba sendo recíproco. São consequências naturais e comuns. O sentimento de amor e amizade segue sendo o mesmo, inalterável. Mas tenho a sensação de não estar em sintonia com os demais. E prometo que não há nenhuma queixa nessas constatações, são apenas isso, constatações.
Ter outras referências acaba impulsando o ato de comparar de forma constante, chega ser quase inevitável. Equilibrar isso é fundamental para seguir disposto a continuar. Apesar de ter duas nacinoalidades, o sentimento apátrido é mais forte que nunca.


sábado, 27 de abril de 2013

Elegia 1938, de Carlos Drummond de Andrade

Trabalhas sem alegria para um mundo caduco,
onde as formas e as ações no encerram nenhum exemplo.
Praticas laboriosamente os gestos universais,
sentes calor e frio, falta de dinheiro, fome e desejo sexual.

Heróis enchem os parques da cidade em que te arrastas,
e preconizam a virtude, a renúncia, o sangue-frio, a concepção.
À noite, se neblina, abrem guarda-chuvas de bronze
ou se recolhem aos volumes de sinistras bibliotecas.

Amas a noite pelo poder de aniquilamento que encerra
e sabes que, dormindo, os problemas de dispensam de morrer.
Mas o terrível despertar prova a existência da Grande Máquina
e te repõe, pequenino, em face de indecifráveis palmeiras.

Caminhas entre mortos e com eles conversas
sobre coisas do tempo futuro e negócios do espírito.
A literatura estragou tuas melhores horas de amor.
Ao telefone perdeste muito, muitíssimo tempo de semear.

Coração orgulhoso, tens pressa de confessar tua derrota
e adiar para outro século a felicidade coletiva.
Aceitas a chuva, a guerra, o desemprego e a injusta distribuição
porque não podes, sozinho, dinamitar a ilha de Manhattan.


Foi publicado no terceiro livro de poemas de Drummond, "Sentimento do Mundo", em 1940.

quarta-feira, 17 de abril de 2013

Milagres do Povo


Jorge Amado faleceu dias antes de completar 89 anos, no dia 06 de agosto de 2001. Caetano Veloso ficou sabendo enquanto comemorava seu aniversário, em um show que fazia em Salvador. Enquanto o público na plateia cantava os parabéns, Paula Lavigne lhe dava a notícia no camarim.
Essa cena saiu no dvd do show "Noites do Norte". Lembro que quando vi pela primeira vez, me emocionei. Achei bonito a forma como Caetano homenageou um dos escritores brasileiros mais internacional. E a música escolhida casou perfeitamente.


Milagres do Povo

Quem é ateu e viu milagres como eu
Sabe que os deuses sem Deus
Não cessam de brotar, nem cansam de esperar
E o coração que é soberano e que é senhor
Não cabe na escravidão, não cabe no seu não
Não cabe em si de tanto sim
É pura dança e sexo e glória, e paira para além da história

Ojuobá ia lá e via
Ojuobahia
Xangô manda chamar Obatalá guia
Mamãe Oxum chora lagrimalegria
Pétalas de Iemanjá Iansã-Oiá ia
Ojuobá ia lá e via
Ojuobahia
Obá

É no xaréu que brilha a prata luz do céu
E o povo negro entendeu que o grande vencedor
Se ergue além da dor
Tudo chegou sobrevivente num navio
Quem descobriu o Brasil?
Foi o negro que viu a crueldade bem de frente
E ainda produziu milagres de fé no extremo ocidente

Ojuobá ia lá e via
Ojuobahia
Xangô manda chamar Obatalá guia
Mamãe Oxum chora lagrimalegria
Pétalas de Iemanjá Iansã-Oiá ia
Ojuobá ia lá e via
Ojuobahia
Obá

Ojuobá ia lá e via...
Quem é ateu...


E já que estamos falando dessa linda música, gosto também da apresentação de Daniela Mercury e Dulce Pontes.

 

domingo, 14 de abril de 2013

Revenge não é só mais uma história de vingança


Estreia hoje na rede Globo a série americana "Revenge" e para quem gosta de um bom entretenimento é uma boa opção.
A trama entra para a vasta lista de obras que foram inspiradas no romance de Alexandre Dumas, "O Conde de Montecristo".  Mas essa especialmente se ressalta pela sofisticação de produção e também pelo excelente trabalho dos atores, destacando a atuação brilhante de Madeleine Stowe e Emily VanCamp.
A primeira temporada estreou em setembro de 2011 nos Estados Unidos, pela emissora americana ABC (a mesma que exibiu Lost) com 22 episódios.
Quando assisti o primeiro, fiquei intrigado e com vontade de assistir o segundo e assim foi até o último. É realmente pegajosa. É puro entretenimento realmente. É dessas séries que a gente senta no sofá para assistir e esquece do mundo. A história é muito bem costurada, cheia de personagens fortes e até agora coerentes com as suas características iniciais.
Tudo indicava que não passaria da primeira temporada, porque o desfecho se aproximava de forma inexorável. E já próxima do final, eu desejava que não houvesse uma segunda temporada. Queria ficar com essa ótima impressão que normalmente se desfaz com a continuidade.
Aí veio a segunda temporada (estreou no dia 30 de setembro do ano passado) e antes mesmo de assistir o primeiro episódio, ouvi de um amigo que eu iria gostar. Ele já havia visto seis. E realmente não se equivocou em afirmar que eu ficaria satisfeito. O fôlego, o ritmo e o dinamismo segue igual ou talvez ainda melhor.
O único problema realmente de seguir uma série é ficar a mercê do calendário comercial da emissora. Revenge costuma sofrer alguns hiatos, mas provavelmente isso não será percebido para os que a seguirão pela rede Globo, pois atualmente a série já caminha para o final da segunda temporada.
Enfim, confesso que sou apaixonado por essa série e que me permito assistir histórias que não me fazem pensar ou refletir sobre as coisas. Isso não significa que a saga de Emily Thorne (Amanda Clarke) seja totalmente superficial, existem aspectos humanos retratados nela que merecem ser observados.
E para os que não assistiram a série, não pensem que irão encontrar semelhanças na protagonista com a Nina de "Avenida Brasil".




No ano passado, mencionei a série em um post que falava sobre a identificação do público com a novela de João Manuel Carneiro. (Há uma Nina em muitos de nós)

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Daniela Mercury, o sol da liberdade


Assim como a maioria dos mortais, Daniela Mercury também não gosta de rótulos. Quando alguém sugere ou afirma isso em alguma frase, parte da militância GLBT torce o nariz. Mas acredito que até mesmo para os mais bravos, o ideal seria se realmente não precisássemos deles ou se não vivêssemos expostos a tantos. Mas ainda não aprendemos a nos entender de outra forma.
Em uma sociedade insana que insiste em fechar os olhos para os que estão fora do  padrão estabelecido e só aponta o dedo no intuito de inferiorizar, quem reivindica respeito acaba ganhando mais estigmas. É um ato cruel que acaba gerando outros tipos de violência, inclusive ceifa vidas.
Mesmo rechaçando etiquetas, afinal, somos um conjunto de características que vive em constante mutação, Daniela entende que assumir rótulos é importante para descaracterizar o pejorativismo que vem neles. Já ouvi muitos gays carregados de homofobia internalizada questionando a necessidade da expressão "orgulho gay". Assim como muitos não compreendem e recriminam os negros que levam camisas estampando "100% negro". É para dizer que sim, sou gay e daí? Sim, sou negro e daí?
Daniela Mercury não será a cantora lésbica e tampouco a que assumiu publicamente a relação com outra mulher em um contexto crucial do debate social sobre os direitos de igualdade e respeito no Brasil. Continuará sendo a artista que sempre esteve preocupada pelas lutas sociais, vivendo a sua arte com muita dignidade e levando alegria para o seu público dentro e fora do país.
A atitude de se posicionar em primeira pessoa não é fácil quando o assunto gera tantos conflitos, principalmente quando se é uma pessoa pública. É mais fácil defender ideias e se posicionar à margem da situação, saindo na tempestade com guarda-chuva. Daniela leva com ela o sol da liberdade e não precisa dessa proteção. Sai com os braços abertos e mãos livres. Leva com ela o sol da dignidade humana. O sol que só brilha para as pessoas politizadas e lúcidas.  O sol que leva os que se preocupam com o outro.
Não é de tolerância que o mundo precisa. Como sempre digo, essa palavra sinaliza diferença de patamares. O superior tolera o inferior. Precisamos simplesmente de respeito.
O ato dela assumir uma relação homossexual publicamente é um passo importante. É balsámo para os que estamos cansados de tantas estupidezes. Contribui para que a parcela da sociedade bem intencionada possa enxergar com naturalidade algo que faz parte da condição humana. Se relacionar afetivamente ou sexualmente com outra pessoa do mesmo sexo é também uma expressão espontânea do ser humano e mesmo que se tratasse de escolha, ainda assim não seria menos respeitável.
Entre Felicianos, Joelmas e Cláudias Leite, temos ainda a sorte de ter Daniela Mercury. É uma pequena luz no meio de tanta escuridão.


Pérolas do presidente da CDHM


Um pequeno acervo de pérolas felicianas recolhidas na internet, onde algumas acabaram ganhando transcendência internacional e se transformaram em piadas para gente de humor ácido em países civilizados.

              Nesse vídeo ele fala sobre Caetano Veloso, Menininha de "Patuá" e Lady Gaga

                                          "Deus matou John Lennon"

                                "Deus matou os Mamonas Assassinas"

                                   Atribuindo AIDS aos homossexuais

                              O vídeo onde condiciona a benção de Deus ao dízimo

                                  Marco Feliciano fala sobre Caio Fábio

                                   Caio Fábio fala sobre Feliciano (2009)

                                        O pastor e o cadeirante tetraplégico

                               Marco Feliciano vendendo a bênção de Deus

Marco Feliciano descaracteriza um órgão público (sustentado por todos nós), que serviria de interlocutor entre a população e seus representantes. Não é difícil perceber que essa pessoa não tem nenhum compromisso social e político.  A presença dele na CDHM é um retrato exato do quanto o Brasil é retrógrado.
Não. Ele não é o único. Existem muitos outros políticos que também estão onde não deveriam estar. Mas se estão é porque foram eleitos e representam parcelas da nossa sociedade.
O debate é importante. Pois sem conhecimento, a ignorância se perpetua e continua sendo a via mais explorada pelos corruptos.
Que a desigualdade social em um país tão rico como o nosso seja tão grande é sinônimo da falta de educação e cultura do nosso povo.



segunda-feira, 8 de abril de 2013

Depois de 66 anos, "Asa Branca" continua voando


Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira gravaram no dia 03 de março de 1947 uma das canções mais populares do Brasil, lançada no disco "Vou pra Roça" dois meses depois.
"Asa Branca" é considerado o hino nordestino, pois retrata bem a tristeza e a agonia da seca e todas as consequências que ela ocasiona. É o lamento do nordestino que se vê obrigado a abandonar a terra natal para buscar fortuna em outro lugar. É quase um fado.
Ao longo dessas quase sete décadas, esse choro foi gravado por inúmeros artistas, ganhando até interpretações internacionais em inglês.

                                                    Luiz Gonzaga

Quando olhei a terra ardendo
Com a fogueira de São João
Eu perguntei a Deus do céu, ai
Por que tamanha judiação

Eu perguntei a Deus do céu, ai
Por que tamanha judiação

Que braseiro, que fornalha
Nem um pé de plantação
Por falta d'água perdi meu gado
Morreu de sede meu alazão

Por farta d'água perdi meu gado
Morreu de sede meu alazão

Até mesmo a asa branca
Bateu asas do sertão
Então eu disse, adeus Rosinha
Guarda contigo meu coração

Então eu disse, adeus Rosinha
Guarda contigo meu coração

Hoje longe, muitas léguas
Numa triste solidão
Espero a chuva cair de novo
Pra mim voltar pro meu sertão

Espero a chuva cair de novo
Pra mim voltar pro meu sertão

Quando o verde dos teus olhos
Se espalhar na prantação
Eu te asseguro não chore não, viu
Que eu voltarei, viu
Meu coração

Eu te asseguro não chore não, viu
Que eu voltarei, viu
Meu coração


                                                    David Byrne

                                                 Lulu Santos

                                                 Caetano Veloso

                                           Chitãozinho, Xororó e Ney Matogrosso

                                                Elis Regina

                                                 Maria Bethânia

                                                Raul Seixas (em inglês)

                                                Fagner e Dominguinhos

Zé Ramalho, Elba Ramalho, Gilberto Gil, Hermeto Pascoal, Tom Zé e muitos outros artistas deram a voz para que o baião "Asa Branca" continue viajando ao longo do tempo por esse mundão.

quarta-feira, 3 de abril de 2013

O HIV Marco Feliciano


O vírus da imunodeficiência humana ataca o sistema imunológico, responsável por proteger o organismo de enfermidades. Assim como muitos outros vírus, ataca de forma invisível e só é percebido quando as suas cópias estão bem multiplicadas e é onde fica mais difícil de ser combatido.
Faço essa analogia ao deputado Marco Feliciano sem receio de ser mal interpretado e talvez também para chamar a atenção especificamente para uma doença que deixou de ser letal e passou a ser crônica, mas que nem por isso, deixou de ser um problema de saúde pública. Em países como o Brasil, o maior efeito colateral para os soropositivos é o estigma social (mas não quero aqui subestimar os outros possíveis danos).

                                     ASSISTA O VÍDEO DE 35 SEGUNDOS


Associar a AIDS aos homossexuais em pleno século XXI, com a quantidade de informações que se tem sobre a doença, em um país onde o índice de analfabetismo funcional é elevado, é um verdadeiro desserviço. É perpetuar a ignorância e criar nas pessoas heterossexuais a falsa ilusão de que eles estão imunes.
Assisti a entrevista que esse político ordinário concedeu ao apresentador, também ordinário, Danilo Gentili, no programa "Agora é Tarde", na Band. Bem articulado, agradecido pela exposição obtida através de sua insórdida presidência em uma CDHM que ele diz que nunca fora tão expressiva como agora. (Não oculto minha indignação sobre as manobras políticas que conduziram esse homem a esse lugar). Em suas respostas foi fácil perceber seu alto teor de vaidade e egocentrismo. (Não me conformo perceber isso em pessoas que se dizem espiritualizadas). De fala mansa, transgiversando algumas perguntas, conseguiu até o merecido reconhecimento de Caetano Veloso, quando mencionou o problema da contaminação pelo chumbo (totalmente desconhecido para todos nós e negligenciado pelas autoridades competentes, isso é um fato) de uma parte da população da terra natal da família Canô.
O pastor" pop" pode até tentar descontextualizar as suas falas que expressam o preconceito e discriminação contra as mulheres, homossexuais, negros e pessoas que não são clientes dele. A questão aqui é tão complexa que existem inúmeros pontos que causam perplexidade naqueles que ainda acreditamos no desenvolvimento social do Brasil.
Ele pode se respaldar no direito de liberdade de expressão quando opina sobre a homossexualidade, por mais equivocado que esteja e por mais lamentável que seja. O problema é que ele não pode presidir uma comissão que serve como interlocutora entre a população marginalizada e seus representantes, principalmente quando ele fomenta essa marginalização. É colocar a raposa para tomar conta das galinhas.
O que deve ser considerado ainda mais grave é ele associar os homossexuais a crimes como a pedofilia e estupro. Em um país realmente sério, ele estaria preso. (Veja aqui essa notícia)
A nossa constituição tenta ser democrática, mas as falhas que nela existem dão brechas para a reprodução de corruptos em vários escalões. Agora mesmo não me vem na mente um país onde exista tamanha pluralidade de mercadores da fé. É óbvio que isso é um reflexo claro da heterogeneidade brasileira.
Era previsível que algum deles chegaria aos holofotes em um cargo político e isso é muito perigoso. Ele se sente representante de 70 milhões de brasileiros. Fala em nome de todos os evangélicos, fomentando a segregação e guerra. Muitos não estão de acordo com ele. E esse suposto farto rebanho não é exclusivamente dele. Há outros pastores como ele que também estão na disputa pela clientela. Mas também estão os que se preocupam  realmente em aproximar as pessoas com a espiritualidade e negar isso é se igualar a esses canalhas.
Já de cara para as eleições presidenciais, Marco Feliciano, parafraseando Rita Lee, é "o HIV que você não vê". Mas assim como a AIDS, ele só não será letal se médicos e pacientes não cuidarem. E esse diagnóstico não se limita exclusivamente à pessoa dele, mas sim, aos que almejam a mesma coisa: fragilizar ainda mais o secularismo brasileiro. E isso sim será  uma ditadura.